Uma das coisas que eu sempre achei mais fantásticas no trabalho com a argila são as metáforas que cada boneco representa.
Metáfora é uma figura de linguagem cujo veículo produz sentidos figurados a partir de uma comparação implícita. Quando digo linguagem, falo de algo que vai além da escrita e falada: passa por imagens e símbolos tanto desenhados quanto esculpidos. Os bonecos são uma maneira de linguagem. A estátua gera signos e símbolos, ela cria significado a partir de sua estrutura.
A estrutura é o ponto fundamental. A mágica que podemos fazer com os bonecos é integrar aquilo que existe "dentro" da pessoa - o que na filosofia da mente chama-se de "qualia" de um estado mental - com algo externo e concreto. É importante esta integração ser precisa no sentido de que as metáforas que o boneco pode desempenhar sejam semelhantes ou idênticas àquelas que a pessoa vivencia. Porém a magia não termina aí.
A metáfora não é apenas uma fonte de externalização do problema, ela também deve ser pensada - acredito eu que principalmente - como uma fonte de solução para o problema. Assim, ao empregá-la deseja-se integrar o interno com o externo para colocar o problema de uma maneira palpável, explicar o problema a partir de um ponto de vista específico e propor, com este ponto de vista, uma solução ou melhor dizendo, uma estrutura de solução que proporcione à pessoa a capacidade de gerar novas soluções para seus problemas.
Isso tudo porque a "metáfora" se relaciona com as cenas vividas pelas pessoas. Ou seja, quando o terapeuta consegue captar o drama da pessoa através do boneco é sinal de que ele integrou uma metáfora com uma experiência interna. O drama interno que o indivíduo vive consegue, então, se externalizar. É a solução para um desejo antigo do ser humano: "queria que você pudesse ver como é aqui dentro da minha cabeça". Podemos fazer isso com os bonecos. Empregados individualmente ou vários de uma só vez eles encenam o drama que a pessoa viveu, eles recriam o passado e o presente - e podem ajudar a elaborar o futuro! Afirmei que a metáfora produz sentido figurados a partir de uma comparação, no caso da terapia comparamos o boneco com a história de vida da pessoa. Esta é a comparação e é o máximo da mágica que eu vejo que este instrumento pode oferecer: re criar ao vivo e a cores cenas que residem apenas dentro da memória da pessoa.
Particularmente tenho alguns bonecos favoritos como "o prisioneiro" e o "sou tão você" (clássicos, eu sei) que deixo permanentemente na minha prateleira. Todos que chegam ao consultório os veem. De tempos em tempos eu apresento um ou outro e faço links com meus clientes. Percebo que estes elos estão fortes quando eles mesmos dizem coisas como: "cheguei aqui e olhei para o prisioneiro... já entendi porque estou me sentido mal". Ou então, algumas vezes, o cliente está falando e eu deixo ele falar enquanto me levanto da cadeira, pego o boneco e coloco-o em frente à pessoa. Ela para de falar, observa e suspira balançando a cabeça em afirmação. Ou diz "ah não, isso de novo!!" Quando usamos as metáforas criamos esta ligação com o inconsciente da pessoa e é por isso que deixo os meus sempre orbitando a sala, ela levará aquela metáfora com ela para sempre e daí a importância de saber qual e como empregar.
Por fim, a maravilha do trabalho com os bonecos é que é algo tão simples e comum à nós quanto brincar de bonecas ou de bonequinhos de chumbo e ao mesmo tempo tão poderoso quanto uma tese de mestrado. Acredito que as coisas simples são as mais poderosas por serem as mais fundamentais, por irem ao âmago da questão. Tenho certeza de que o trabalho com os bonecos tem estas duas características: simplicidade e poder. Estas duas características que permitem que quando mostramos aquela estátua, aquele ícone às pessoas, estejamos criando um canal direto com o inconsciente de cada uma delas.