Umas das minhas metáforas favoritas no método da Argila é o prisioneiro. Para mim ela representa a metáfora-base de todos que buscam terapia.
Os existencialistas dizem que somos livres para escolhermos nossas prisões, assim sendo todos os nossos pontos de vista podem ser encarados como prisões - algumas momentâneas e outras permanentes. O que aprisiona, no entanto, não é o conteúdo (as grades) daquilo que pensamos, mas sim a maneira de olhar o conteúdo.
Quando o boneco está muito próximo da grade, tudo o que ele vê são as barras. Elas passam a ser uma "verdade" existencial para ele. Assim a sua percepção de mundo e dele mesmo está restrita ao que ele consegue ver. Compreender que estamos perto demais das grades é o primeiro passo.
Quando afastamos o boneco da grade ele percebe (talvez atônito) que o mundo é maior do que ele imaginava. Neste momento é que ele pode compreender que aquilo que ele pensava ser "a" verdade é apenas mais uma verdade. No filme "V de vingança", a prisão na qual a personagem "Eve" foi colocada é apenas um teatro, porém, esta realidade teatral só é percebida quando ela se afasta da qualidade de prisioneira e se vê como uma pessoa "livre", mesmo enjaulada.
A questão para nossos clientes é: o que significa, na sua vida prática, afastar-se da grade? Dar um passo atrás e ver a grade como grade e não como realidade é importante, mas como fazê-lo? É isso que medito com meus clientes quando afasto o prisioneiro. O ato exige esforço, é uma atitude afastar-se da grade.
Afastar-se das grades significa dizer não? Começar a fazer uma atividade física? Pensar antes de agir? Perceber como o outro é a partir de seus comportamentos e não nossas fantasias? Pode ser isso tudo e muito mais. Sabemos que alguém se afasta das grades quando ele pode olhar o seu comportamento anterior e compreendê-lo de uma outra perspectiva, agora mais rica.
Este é o momento de perguntar à pessoa: e agora, olhando em volta, o que você pode ver? Ao movermos o boneco em sincronia com esta pergunta, concretizamos o ato de olhar além. O boneco não tem um cenário para ver, assim como a pessoa também não tem. Novamente o existencialismo entra em cena quando nos oferece a perspectiva de que o que vemos não nos é dado, mas sim construído.
O que o prisioneiro tem quando saí da cadeia? Um mundo novo à ser explorado. Como explorar? A partir da perspectiva que ele tem do mundo, que ele irá criar do mundo. Isto é liberdade: criar a nossa percepção e usá-la até precisarmos de outra. Isso é o que vejo como a expressão máxima da metáfora do prisioneiro: que a mesma percepção que nos aprisiona é, também a nossa chave para a liberdade.