O Inconsciente Ganha Forma Através do Barro

O método “Argila: Espelho da Auto-Expressão”, desenvolvido desde 1984, vem complementar as formas do advir do inconsciente e sua compreensão. Ele visa a auxiliar os indivíduos em suas problemáticas, facilitando a expressão simbólica nas modelagens em argila dos sentimentos, das percepções e angústias. Desse modo, possibilita ao paciente construir imagens e esculturas representativas de seu íntimo, que dentro do setting terapêutico terão um sentido conforme ele puder falar a respeito de sua produção com este material. Para a Psicanálise, é fundamental a verdade do sujeito. A cada modelagem em argila, um novo conteúdo surge no contexto terapêutico, ocorrendo uma construção que desvela uma verdade, mas não a última.

 

Mãos a obra
Mãos a obra!

O método também auxilia o profissional para um melhor entendimento do psiquismo de seu paciente e, consequentemente, obtém melhores resultados dentro do processo psicoterápico. Apesar das divergências quanto ao perceber e ao conceber da dinâmica do ser humano, existe uma preocupação comum: aliviar o mal-estar daquele que está sofrendo.

Concebido como uma tentativa de auxiliar a expressão verbal dos sujeitos, o método possibilita melhor diagnóstico e intervenção terapêutica, e favorece um maior autoconhecimento. A argila foi escolhida entre os recursos terapêuticos por revelar-se como primitiva, energética, natural, e possibilitar na construção das modelagens o tridimensional, o concreto e a individualidade, aproximando mais dos aspectos de realidade. Ao trabalhar com a argila, o sujeito coordena os órgãos dos sentidos, mãos e olhos, transformando a matéria prima argila numa escultura, que conterá os conteúdos internos de seu autor. Em Sintaxe da Linguagem Visual, a professora de comunicação Donis A. Dondis explica que é no trabalho das mãos e dos olhos, em que o que é olhado é confirmado pela objetividade do tato, que o sujeito projeta forte conteúdo associativo.

Crianças

Inicialmente, o trabalho foi realizado com crianças por ser um material lúdico e facilitador do processo terapêutico. Em seus estudos, a psicóloga e pesquisadora Violet Oaklander afirma que “... a criança agressiva pode usar a argila para bater e socar. Crianças zangadas podem descarregar sua raiva na argila de numerosas maneiras...”, fazendo animais ou formas agressivas e cheias de adornos pontiagudos, que poderão ser pintadas ou desmanchadas, ou pintadas e/ou quebradas. “Aqueles que estão inseguros e temerosos podem ter uma sensação de controle, domínio, através da argila...”, já que não há regras para a sua confecção, e pela liberdade que ela imprime não poderá ocorrer erro, trazendo como uma vantagem a mais a livre exploração e busca de soluções. Posteriormente, adolescentes e adultos também foram submetidos a esse trabalho, mostrando a possibilidade de a argila ser aplicada em todas as faixas etárias.

Atualmente, o método é aplicado em sujeitos a partir dos 3 anos de idade, em sessões individuais, de casal ou familiar, independentemente do sexo, escolaridade ou estado civil, que realizam tratamento psicoterápico e que aceitaram, em alguns momentos do processo, submeter-se a tal instrumento.

Sua aplicação é fácil e prática, podendo ser realizada de três maneiras: a) sujeito e terapeuta modelam conforme tema livre ou tema dirigido – apresentando os seguintes procedimentos: secagem das peças, quebraduras, colagem, pintura, exposição das peças, destino das esculturas e novas elaborações; b) tema escolhido pelo sujeito a partir das esculturas previamente confeccionadas; c) escultura escolhida pelo terapeuta como tema. Assim se torna um modelo de trabalho novo com um material muito primitivo. Respeita a individualidade, pode ser aplicado conforme a necessidade e o momento, levando à transformação da dinâmica enraizada e petrificada daquele que busca auxílio.

Conforme o método foi sendo construído, por avanços e recuos, acertos e erros, questões foram sendo suscitadas, tais como: O relaxamento propiciado pelo manuseio da argila facilitaria ao sujeito falar de seus conteúdos? Quais os mecanismos que levam o paciente a eleger determinada imagem ou pintá-la com certas cores neste momento? O que leva o indivíduo a realizar sua escultura de determinada forma, quando a imaginou de outra? Por que elabora parte da peça esculpida mais frágil, vindo a quebrar-se nestes locais e em outros não? O método seria uma forma de facilitar a manifestação dos conteúdos internos dos sujeitos?

Respostas

Uma vez que a Psicanálise é constituída por um conjunto de hipóteses a respeito do funcionamento e desenvolvimento da vida psíquica do sujeito, tendo por objeto de estudo e de trabalho o inconsciente, pode auxiliar nas respostas para tais indagações. Já que o inconsciente é definido pelo psicanalista francês Jean Laplanche como o “conjunto dos conteúdos não presentes no campo atual da consciência”, representantes das pulsões que, ao reinvestirem o conteúdo desta energia pulsional, somente conseguem ter acesso ao sistema pré-consciente/consciente após terem se submetido às deformações da censura e se transformado em formação de compromisso.

Tais representantes são regidos pelos mecanismos do processo primário (condensação, deslocamento e figurabilidade), em que as fixações do sistema são realizadas pelos desejos infantis. Poderíamos citar as seguintes formações de compromisso: sintoma, sonhos, chistes, lapsus linguae, ato falho. É por estas formações que os conteúdos inconscientes ultrapassam a barreira da censura. À medida que o sujeito na terapia submete-se à técnica da associação livre – que consiste em convidar o paciente a falar sobre os pensamentos que lhe vierem à mente, de maneira espontânea, sem crítica, sem censura, sem pudor, a partir de uma palavra ou tema –, aos poucos irá dando sentido a tais manifestações e com este recurso técnico o inconsciente pode advir.